segunda-feira, 2 de setembro de 2019

JOÃO 14

JOÃO 14


A palavra de advertência foi imediatamente seguida por uma palavra de abundante graça. Jesus sabia muito bem que esses discípulos, apesar de todas as falhas que tinham, realmente O amavam, e o pensamento de Sua partida foi uma dolorosa tristeza para eles. Daí as palavras que abrem nosso capítulo. Eles estavam começando a perceber que perderiam Sua presença visível entre eles; esse foi o problema que turbou o coração deles. Mas então o Deus invisível já tinha sido real para eles, como o Objeto de fé. Não poderia Cristo, de agora em diante, ser o mesmo? Ele realmente seria assim. Como Objeto de fé, Ele seria uma realidade viva e brilhante para incontáveis milhões, ao passo que, se Ele permanecesse como era, só poderia ser o Objeto de vista para alguns em uma localidade de cada vez. Então, o primeiro item de conforto para corações atribulados é: Cristo, como o Vitorioso ressuscitado da morte, o Objeto da fé simples.
E o segundo item é: um lugar preparado e seguro nas muitas moradas da casa do Pai nas alturas. Ora os discípulos eram homens que haviam apostado tudo em sua crença de que eles encontraram o Messias presente na Terra em carne e osso. Eles haviam desistido de um lugar como o que possuíam na Terra e Ele estava para deixá-los, por quê? Como eles aprendem aqui, por um lugar de relacionamento mais próximo, de muito maior elevação, permanecendo eternamente além do alcance da morte. Que troca maravilhosa! O templo terrestre havia sido “a casa de Meu Pai” (Jo 2:16); isso agora é rejeitado, e a verdadeira “casa do Pai” é encontrada no alto, na qual Ele estava prestes a entrar. Nela há muitas moradas, como havia sido indicado pelas muitas câmaras da figura terrestre. Seu lugar particular e o nosso deveriam ser preparados por Sua entrada lá. Ele a mantém para nós como nosso Precursor, como é mostrado em Hebreus 6:20.
Por necessidade, portanto, um tempo deve chegar quando os santos irão entrar no lugar preparado para eles; assim, no versículo 3, encontramos um terceiro item de conforto – Sua vinda pessoal para nos receber para Si mesmo, para que possamos estar com Ele na casa do Pai. Os discípulos devem ter aprendido do Velho Testamento que haveria uma vinda pessoal de Jeová: como exemplo: “estarão os Seus pés sobre o monte das Oliveiras ... então virá o Senhor [Jeová – TB] meu Deus, e todos os santos Contigo” (Zc 14:4-5). Mas eles não haviam percebido que “Jeová” era “Jesus”, e eles nada sabiam sobre essa vinda, a fim de receber santos para Si mesmo, pois isso não havia sido anunciado. Era uma nova revelação, tanto a de que os santos deveriam ter um lugar nos céus, ou como a de que o Messias deveria estar como o Objeto de fé, em vez de estar visivelmente presente na Terra.
Podemos dizer então que o versículo 1 nos dá, em embrião, aquela vida “na fé do Filho de Deus”, da qual Paulo fala em Gálatas 2:20. O versículo 2 nos dá, em embrião, a verdade do chamamento celestial, mais plenamente exposto em Efésios 1:3-6 e em Hebreus 2:9, 3:1. O versículo 3 nos dá a primeira indicação da vinda do Senhor para Seus santos. O arrebatamento deles para a Sua presença acima é mais plenamente exposto em 1 Tessalonicenses 4:14-18. Ali também, como aqui, esta verdade foi feita conhecida para trazer conforto aos corações atribulados.
Jesus concedeu aos Seus discípulos o conhecimento de aonde ele estava indo e o caminho. Tomé era o discípulo materialista e, portanto, tinha uma mente vacilante. Sua objeção serviu para trazer um dos maiores pronunciamentos do Senhor. Ele é o caminho para o Pai, a verdade sobre o Pai, a vida, por cuja energia, o Pai pode ser realmente conhecido. Não existe outro caminho de aproximação além do Filho. Além disso, estando na vida caída de Adão, não temos capacidade de entrar no conhecimento do Pai: tal conhecimento só é possível para aqueles que estão na vida de Cristo. Quanto mais meditarmos nessas palavras, tanto mais perceberemos a toda-suficiência de Cristo; como também que eles rendiam seu tributo ao fato de que a plenitude da Divindade habitava n’Ele (Cl 1:19, 2:9).
O melancólico pedido de Filipe, no versículo 8, mostra que ele também desejava que o Pai Se mostrasse diante de seus olhos de maneira material. Ele não estava errado nisso, mas apenas falhava em não discernir a manifestação que havia sido feita em Cristo, que era o Verbo feito carne. Como João diz nas palavras de abertura de sua primeira epístola, o Verbo, assim, tornou-Se audível, visível e tangível. O Pai, portanto, foi perfeitamente demostrado. As palavras de Jesus eram as palavras do Pai, e as Suas obras foram feitas pelo Pai que habitava n’Ele. No versículo 17 de nosso capítulo, temos uma alusão ao fato de que o Espírito estava com eles habitando em Cristo; e aqui está o Pai que habita n’Ele. Assim nossos pensamentos são novamente conduzidos a Colossenses 1:19.
Suas palavras e obras corroboraram a grande afirmação que o Senhor faz duas vezes aqui. Quanto à essência do Ser, da vida e da natureza, Ele estava “no Pai”, como também o Pai estava n’Ele, em manifestação e exibição. Os discípulos deveriam crer nisso exatamente porque Seus próprios lábios declararam isso; mas se não, deveriam receber a evidência de Suas obras, que tão claramente a declararam. E mais do que isso, o dia estava chegando, como declarado no versículo 12, quando obras semelhantes e ainda maiores deveriam ser feitas por meio dos discípulos, e porque Ele estava indo para o Pai, o que, como aprendemos em João 7, significava a vinda do Espírito. Naquele dia os discípulos iriam descobrir que eles próprios estavam em Cristo e que Cristo estava neles (v. 20), e isso, sem dúvida, explica as obras “maiores”. Antes de Sua morte e ressurreição, o Senhor estava “angustiado” (Lc 12:50); mas uma vez que elas fossem cumpridas e o Espírito dado, Ele poderia agir livremente pelo Espírito por meio de Seus discípulos. Não houve um dia no ministério do Senhor em que 3.000 almas fossem convertidas como no dia de Pentecostes; nem Seus labores cobriram a imensa área “desde Jerusalém, e arredores até ao Ilírico”, como os de Paulo.
Nos versículos 13 e 14, o Senhor confortou Seus discípulos com o poder de Seu nome. Ele indicou assim que iria deixá-los para que servissem como Seus representantes. Os pedidos deles, se realmente feitos em Seu nome, seriam certamente atendidos. Ele mesmo agiria em causa deles, embora ausente deles. Seu objetivo ao fazê-lo não seria apenas a manutenção de Seus próprios interesses, mas para que o Pai pudesse ser glorificado. Assim, o Pai seria glorificado em Suas atividades em ressurreição e glória, assim como Ele também estava na hora sombria de Sua morte.
Sem dúvida, este agir e pedir em Seu nome tinha referência especial aos Seus apóstolos, mas certamente se aplica a todos nós. Temos que nos lembrar de que só podemos usar corretamente o nome do nosso Mestre em conexão com Sua causa e interesses. Se tentarmos usá-lo meramente para promover nossos próprios desejos pessoais, seremos culpados do que os tribunais de justiça chamam de “abuso de autoridade”, para o qual uma pesada pena está prevista. A promessa aqui só se aplica, é claro, onde a oração é genuinamente em Seu nome.
Até aqui tivemos cinco itens de grande conforto diante de nós, com o propósito de assegurar ao triste coração de Seus discípulos que haveria grande ganho para eles, a despeito do fato de que eles perderiam Sua presença entre eles. Vamos recapitulá-los:
  • Ele ainda estaria acessível a eles como o Objeto de fé;
  • Havia um lugar assegurado a eles na casa do Pai;
  • Ele viria novamente para que eles pudessem estar com Ele naquele lugar;
  • O Pai lhes fora inteiramente revelado;
  • Eles deveriam permanecer no mundo como Seus representantes, com a autoridade de Seu nome para dar poder às suas orações. 
Agora passamos para um sexto item de igual conforto.
A vinda do Espírito Santo é definitivamente prometida. O Senhor apenas presumiu uma coisa – que eles realmente O amavam, pois o amor genuíno sempre se expressa em obediência; e o amor é em si mesmo a natureza divina. Exatamente o amor deles é tido como certo. E tido como certo, Ele oraria ao Pai quando subisse ao alto e, em resposta a Seu pedido, o outro Consolador viria. Ora “Consolador” significa “Alguém que fica ao lado para ajudar”. O próprio Jesus tinha sido Esse entre eles na Terra, e ainda O seria, embora no céu, ausente deles; a mesma palavra é para “Advogado” (1 Jo 2:1). O Espírito seria Esse conosco aqui na Terra, e uma vez vindo, Ele habita conosco para sempre.
O Consolador é também o Espírito de verdade. A verdade, juntamente com a graça, “vieram [subsistem – JND] por Jesus Cristo” (Jo 1:17), e Ele é a verdade, como acabamos de ver, apresentada a nós de maneira objetiva. O Espírito de verdade está agora por vir, habitando nos santos e, assim, trazendo verdade para eles subjetivamente. Assim, quando chegamos a 2 João 2, lemos que a verdade “que permanece em nós” (ARA) pelo Espírito, além de estar “conosco para sempre” (TB) em Cristo. O mundo não compartilha disso. Ele não tem a natureza divina, nem anda em obediência; portanto, não pode receber o Espírito. Não O vê nem O conhece, ocupado como está com as coisas materiais.
Tudo isso era uma segurança para os discípulos de que não seriam deixados “desconsolados” (KJV), ou “órfãos”, mas que pelo Consolador Ele viria a eles, e assim Sua presença seria uma realidade no coração deles.
O Consolador é dado como selo de amor e obediência, e nesse sentido, a plena bênção de Sua habitação só é desfrutada quando a obediência é aperfeiçoada em nós. O versículo 15 indica que, sendo o fruto do amor, a obediência é a prova de que o amor existe. Agora encontramos que o fruto da obediência é uma posição especial no amor do Pai e do Filho, juntamente com uma manifestação especial do Filho, que deve levar consigo uma manifestação especial do Pai, na medida em que só conhecemos o Pai como revelado no Filho. A manifestação objetiva é perfeita, completa e permanente, mas a manifestação subjetiva de cada um de nós individualmente, no poder do Consolador, depende da medida em que somos caracterizados pela obediência e amor.
A questão de Judas (v. 22) evidentemente foi motivada pelo fato de que os pensamentos dos discípulos estavam totalmente concentrados na manifestação pública do Messias, como anunciado no Velho Testamento. Eles ainda não tinham abraçado o caráter da dispensação prestes a surgir, na qual o conhecimento d’Ele mesmo seria por fé no poder do Espírito. O Senhor respondeu ampliando Suas palavras anteriores, falando agora de guardar Sua palavra – não “palavras”, mas singular – “palavra”, a verdade que Ele trouxe como um todo – como o fruto de amor. Tal amorosa obediência incita a apreciação e o amor do Pai, de modo que tanto o Pai como o Filho faz a Sua morada; por meio do Espírito que habita em nós, sem dúvida, pois esses grandes pronunciamentos vêm na seção do discurso dedicado ao Consolador. Assim, as Suas palavras, pelas quais a Sua Palavra nos é transmitida, tornam-se o teste do nosso amor. Elas nos conduzem à palavra do Pai que O enviou. Se as desconsideramos, nossas declarações de amor a Ele serão comprovadas vãs e insinceras.
Isso nos leva a uma outra função do Consolador: sendo “o Espírito de verdade”, Ele é o Instrutor dos discípulos. Não devemos perder o contraste, nos versículos 25 e 26, entre estas coisas” (TB) e todas as coisas”. Quando, como fruto de Sua obra, Jesus deve ser glorificado e o Espírito ser dado, deve haver uma revelação maior da verdade divina. Todas as coisas que estão no escopo da revelação devem ser conhecidas e eficazmente ensinadas aos discípulos pelo Consolador. Muito lhes foi feito conhecido por Cristo, presente entre eles em carne e osso: tudo lhes seria feito conhecido no dia vindouro do Espírito. Aqui encontramos prometida, quanto à revelação e ensino, a mesma expansão quanto às obras pela vinda do Espírito, como vemos declarado no versículo 12. Além disso, o Espírito lhes traria à lembrança todas as coisas que tinham ouvido por meio de Cristo.
Estamos agora na feliz posição de ver quão literal e perfeitamente essas coisas foram cumpridas. Os quatro evangelhos foram escritos como o fruto das coisas que Ele disse sendo trazidas à lembrança dos discípulos; enquanto como fruto dos adicionais e mais novos ensinamentos do Espírito, temos as epístolas, ministrando a plena luz da fé Cristã e do conselho de Deus.
Já havíamos notado anteriormente que a chegada do Consolador forneceu o sexto item no conforto que Jesus estava ministrando a Seus discípulos. Agora encontramos o sétimo e último neste capítulo; ou seja, a paz. Ao partir Ele deixou a paz com eles, deixada como resultado de Sua obra expiatória. Além disso, Ele lhes deu aquela paz que Ele chamou de peculiarmente Sua – a paz de perfeita confiança no Pai, como resultado de conhecê-Lo e de submissão à vontade d’Ele. E tudo o que Ele dá provém de Sua própria plenitude e ligando-os a Si mesmo, e não de acordo com os pobres padrões deste mundo.
Tendo assim revelado aos discípulos todos esses grandes itens de encorajamento, o Senhor terminou no mesmo tom que Ele começou – “Não se turbe o vosso coração, nem se atemorize”. Exatamente a mesma palavra vem até nós quando enfrentamos as grandes dificuldades de nossos dias.
Mas os discípulos deviam conhecer não apenas a paz, mas também o gozo. Isso de fato aconteceu quando o Espírito foi dado, e mesmo antes, como Lucas 24:52 testifica. Eles estavam apreendendo o fato de que Ele estava indo embora e deveriam perceber que, no entanto, Ele estava vindo até eles pelo advento do Consolador. No entanto, havia mais uma coisa: Ele estava indo para o Pai, e a tudo o que estaria envolvido com isso – aprovação e glória infinitas no amor do Pai. Isso seria extremo gozo para Ele e, amá-Lo seria para a exultação deles também. Não conhecemos esse gozo também? Não está o pensamento de Seu gozo entre as mais profundas de nossas alegrias?
As últimas palavras deste versículo, “Meu Pai é maior do que Eu” (ARF), foram transformadas num motivo de tropeço para alguns. Mas aqui temos falado do Verbo feito carne, e Ele fala em Seu estado como o Homem humilde na Terra. Por isso, em posição ou posto, o Pai era maior que Ele, porém, quanto ao Ser e à natureza, Ele e o Pai eram um.
As palavras do Senhor no versículo 29 lançam grande luz sobre tudo o que está contido neste capítulo. As coisas de que Ele estivera falando ainda não haviam se cumprido, pois primeiro deveria ser realizada Sua obra de redenção. Sendo realizada, as outras coisas viriam a acontecer, e Ele lhes estava dizendo agora para que nos dias vindouros eles pudessem crer. Ao dizer isso, o Senhor novamente indicou que o nosso dia é aquele em que a fé é de suma importância. O dia de Israel havia sido caracterizado por coisas visíveis e tangíveis, mas todas as coisas que Ele tinha acabado de lhes falar devem ser apreendidas por fé e não por vista. Tanto a paz como o gozo alcançam nosso coração por fé. Assim, encontramos Paulo falando de “todo gozo e paz no vosso crer ... pelo poder do Espírito Santo” (Rm 15:13 – ARA), e Pedro dizendo: “sem agora O verdes, mas crendo, exultais com gozo indizível e cheio de glória” (1 Pe 1:8 – TB).
O Senhor agora indicou que Suas conversas com os discípulos estavam chegando ao fim. O que estava diante d’Ele era o pleno cumprimento da obra que o Pai havia ordenado. Mas antes que esse fim fosse plenamente alcançado, Satanás, o príncipe deste mundo, estava novamente vindo, empunhando o poder das trevas, mas não encontraria n’Ele nenhum ponto de ataque. Satanás não tinha nada em Cristo porque o Pai tinha tudo – todo o Seu amor e obediência. Ele não estava encontrando o homem num estado de inocência, como foi com Adão no Éden, mas o Homem em absoluta santidade e justiça e, sobretudo, o Verbo que era Deus. O grande Antítipo do servo hebreu, descrito em Êxodo 21:2-6, foi encontrado aqui dizendo: “Eu amo o Pai”, o equivalente a “Eu amo a Meu Senhor ... não quero sair livre” (ARF); assim como em João 13:1, tivemos a declaração do Seu amor àqueles tipificados pela esposa e filhos em Êxodo.
Parece que as palavras “Levantai-vos, vamos-nos daqui” marcam a saída deles do cenáculo, e que o que temos nos dois capítulos seguintes foi dito a caminho do Getsêmani. A mudança na posição foi acompanhada por uma mudança no assunto e em João 15 Jesus contempla Seus discípulos como estando no mundo com privilégios e responsabilidades correspondentes e não como em seu novo lugar e estado como diante do Pai, que era o assunto em João. 14. Do mesmo modo como lá, Ele deu Seu lugar diante do Pai a eles, assim agora eles estão identificados com Ele em Seu lugar diante do mundo. Ele é a Videira verdadeira e eles as varas.

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