quarta-feira, 28 de agosto de 2019

JOÃO 8

JOÃO 8

No entanto, os líderes sentiram que tinham decididamente resolvido a questão, e retiraram-se para o conforto de seus lares, enquanto Jesus, o Verbo feito carne, sem lar, passava a noite no Monte das Oliveiras. Retornando de manhã cedo ao templo, Ele foi confrontado por alguns desses próprios adversários com um caso que, como esperavam, O apanharia nas dificuldades de um dilema. A multidão poderia ser ignorante quanto à lei e ser maldita; Seus adversários conheciam bem a lei e se consideravam abençoados por ela; eles também conheciam a bondade e a graça de Jesus. Então eles colocaram a mulher pecadora no meio e citaram a lei de Moisés contra ela. O resultado não foi o que eles esperavam. O Senhor dirigiu a lei como um holofote sobre eles, e seu poder convincente alcançou até mesmo a consciência endurecida deles. Estes hipócritas religiosos duplamente mortos, que falavam sem hesitação sobre a maldição que se aproximava da multidão, viram agora a maldição da lei surgindo contra eles mesmos e desapareceram.
A ação de Jesus ao inclinar-Se e escrever no chão é muito significativa. Aqui estava, se assim podemos dizer, o dedo que uma vez escreveu a lei em duas tábuas de pedra – a lei que escreveu uma sentença de destruição contra Israel. O mesmo dedo havia escrito uma sentença de condenação contra uma orgulhosa monarquia gentia nos dias de Daniel, sobre a parede estucada do palácio real. Os materiais onde foram escritas são impressionantes. A lei inflexível escrita em pedra inflexível; consequentemente o desprezador da lei de Moisés “morre sem misericórdia” (Hb 10:28), já que a lei não pode ser flexionada como uma borracha. A parede estucada é frágil e facilmente quebrada, como os reinos humanos mais fortes e orgulhosos. Jesus escreveu no chão. O que Ele escreveu lá não nos é dito, mas sabemos que Ele estava indo para o “pó da morte” (Sl 22:15), onde Ele escreveu uma declaração completa do amor de Deus.
Em Apocalipse 5, o livro de julgamento é colocado à vista, e um anjo forte em voz alta lança o desafio: “Quem é digno de abrir o livro e de desatar os seus selos?” Jesus emitiu exatamente esse desafio, embora em palavras diferentes. O resultado do desafio então será que “ninguém no céu, nem na Terra, nem debaixo da Terra” foi capaz de abrir ou mesmo olhar para aquele livro; assim como aqui todos os acusadores se afastaram. Então o “Leão” que Se tornara o “Cordeiro” é deixado sozinho para executar os julgamentos. Aqui “ficou só Jesus e a mulher que estava no meio”; todavia não foi a hora do julgamento, mas da graça, e assim aqu’Ele que tinha o direito de condenar não o exerceu. Ele estava “cheio de graça e verdade”. Ele virou o holofote da verdade sobre os hipócritas e estendeu a graça à pecadora, com vistas à libertação dela do pecado.
Desse incidente surgiu uma solene controvérsia entre o Senhor e os judeus, e o relato dela preenche o restante do capítulo. Suas palavras de abertura, no versículo 12, referem-se ao incidente e é a chave para o que se segue. No início do evangelho, vimos que o Verbo era o Originador da vida e era a Luz que brilhava nas trevas. João 3-7 nos apresentou Ele como a Fonte da vida eterna. Agora Ele vem diante de nós como a Luz, e no final de João 12 o resultado dessa apresentação é resumido para nós. Jesus é a luz não somente de Israel, mas do mundo, e aquele que O segue terá a luz da vida que foi manifestada n’Ele, não importando de onde ele tenha vindo. Aquele que não O seguiu permaneceu em trevas, mesmo que ele fosse o judeu mais ortodoxo que se possa imaginar.
Em João 5, o Senhor havia indicado quão amplo era o testemunho que Lhe era prestado, de modo que Ele não estava na posição de Se chegar até eles com credenciais autoproduzidas. Os fariseus agora se agarram às palavras que Ele então usou e tentaram condená-Lo com base na inconsistência verbal. Ele não retirou Suas palavras nem as explicou. Ele simplesmente apelou para coisas de uma natureza muito mais elevada que os condenou por ignorância e erro. Como meros homens, seu conhecimento próprio é pequeno. O que está por trás deles e o que está adiante, ambos estão envoltos em um véu de mistério impenetrável. Não havia tal limitação com Ele. Seu conhecimento próprio era divino e eterno. Esses fariseus eram tão ignorantes de si mesmos quanto eram d’Ele. Eles também estavam em erro, uma vez que todos os seus julgamentos foram formados pela carne, na qual nenhum bem habita. No julgamento carnal deles em relação às Suas palavras, eles estavam errados, embora espertos em atacar o que parecia ser uma contradição.
No caso da mulher, o Senhor havia recusado o lugar do juiz. Será Seu num dia vindouro, mas não hoje; e Ele o nega novamente aos fariseus no versículo 15. No entanto, em Seu aviso, Ele novamente Se compromete com um paradoxo verbal, pois afirma a verdade de Seus juízos, visto que Ele é tão totalmente um com o Pai que O enviou. Na era vindoura, todo julgamento será d’Ele, mas Ele o executará em pleno acordo com o Pai. Assim também na questão do testemunho de Si mesmo, todo o peso da autoridade do Pai estava por trás dele. Esta referência ao Pai, de Sua parte, só serviu para trazer à luz a completa ignorância da parte deles. O Pai só pode ser conhecido no Filho, a Quem eles não receberiam. Se eles tivessem conhecido o Filho, eles conheceriam o Pai.
O versículo 20 testemunha o poder dessas palavras de nosso Senhor como também o poder de Sua Pessoa. Suas palavras fizeram com que eles O quisessem prender, mas havia algo sobre Ele que os impedia, até que chegou a hora em que Ele deu a Si mesmo à vontade deles. O Senhor, porém, continuou Seu testemunho a eles.
Ele estava seguindo o caminho deles e os procurando em graça. Estava chegando um momento em que Ele seguiria Seu próprio caminho e eles O buscariam inutilmente e morreriam em seus pecados. Então eles seriam cortados d’Ele e de Deus para sempre. Essa completa mudança na situação não seria apenas justa, mas apropriada. Novamente no versículo 22 vemos completa ignorância com os judeus, e que a mente deles era vil até o mais baixo nível. Eles eram de fato “cá de baixo” (ARA) em todos os sentidos das palavras. Isso levou o Senhor a traçar o nítido contraste entre eles e Ele mesmo. Primeiro a origem: eles são de baixo; Ele é de cima. Segundo, quanto ao caráter: eles são deste mundo; Ele não é deste mundo. Terceiro, quanto ao fim: eles estavam para morrer em seus pecados e serem excluídos de Deus; Ele estava indo para o Pai, como Ele já havia dito. Somente a fé n’Ele poderia evitar o destino deles – a fé que iria descobrir n’Ele o “EU SOU”. Em Êxodo 3:14, Deus revelou-Se como o grande “EU SOU”, portanto, essa declaração de Jesus era virtualmente uma reivindicação à Deidade.
Os judeus não haviam percebido isso até então, mas evidentemente viram que Sua reivindicação era grande, pois imediatamente perguntaram: “Quem és tu?” Eles receberam uma resposta surpreendente: “Exatamente o que venho dizendo que Sou” (AIBB). Ele era a verdade, e Sua linguagem era uma apresentação verdadeira e exata de Si mesmo. Isso não pode ser dito do melhor e mais sábio dos homens. Se disséssemos, não poderíamos nos manifestar com precisão em palavras. Se pudéssemos, deveríamos evitar fazê-lo, sendo o que somos. Suas palavras foram a verdadeira revelação de Si mesmo; como poderíamos esperar quando sabemos que Ele é o Verbo que Se fez carne. Vamos ponderar profundamente nesta palavra de Jesus, pois traz consigo a certeza de que nos evangelhos temos uma real e verdadeira revelação de Cristo. Eles nos dão o que Ele fez assim como o que Ele disse; mas somente por Suas palavras podemos verdadeiramente conhecê-Lo, embora nunca O tenhamos visto nos dias de Sua carne. O que Ele disse que é, Ele é totalmente.
O versículo 26 nos mostra que tudo o que Ele tinha a dizer sobre os homens era igualmente a verdade, porque tudo era falado a respeito do Pai e vindo do Pai. Eles eram totalmente ignorantes quanto ao Pai, e totalmente incrédulos quanto ao Filho presente entre eles. Quando eles levantassem o Filho do Homem, deveria haver uma demonstração do fato de que Ele realmente era o “EU SOU” e que, em todos os sentidos, o Pai estava com Ele. Sua elevação foi Sua morte, e, após consumada, ressurreição sobreviria, que O declararia ser o “Filho de Deus em poder, segundo o Espírito de santidade” (Rm 1:4 – JND). Então eles saberiam, no sentido de ter uma demonstração perfeitamente ampla diante de seus olhos. Alguns poucos sabiam, no sentido de ser iluminado pela demonstração, mas a massa deliberadamente fechou os olhos para a luz. Ainda assim, a demonstração de que Ele era total e sempre agradável ao Pai estava à disposição de todos os olhos para ver.
O poder de Suas palavras foi sentido e muitos tomaram o lugar de crer n’Ele. O Senhor os testou dizendo-lhes que aquele que não era um mero seguidor nominal, mas um verdadeiramente discípulo é caracterizado por continuar em Sua palavra; isto é, em toda a verdade que Ele trouxe. A continuidade é sempre o teste da realidade, e onde isso existe, a verdade é conhecida em seu poder emancipador. O diabo escravizado pelo poder de sua mentira: Cristo liberta pelo poder da verdade de Deus. Ele não os elogiou dizendo que, como nação de Deus, eles eram livres. Ele colocou diante deles a verdadeira liberdade espiritual que é o resultado do conhecimento da verdade. Isso era o que eles precisavam, e nós também!
Muitos falharam no teste, pois seu orgulho nacional e religioso foi ferido. Eles poderiam ser a semente de Abraão segundo a carne, mas para afirmar que nunca foram escravos de ninguém, enquanto estavam em completa sujeição aos romanos, apenas provava sua cegueira. Por Sua declaração enfática do versículo 34, Jesus dirigiu os pensamentos deles para a escravidão do pecado. Os homens não podem praticar o pecado sem estarem escravizados por ele – um tremendo pensamento para cada um de nós. Ora o lugar do escravo é do lado de fora da casa, mas em contraste com ele está o Filho, cujo lugar é dentro e para sempre. E o Filho não só tem esse lugar permanente, mas Ele pode libertar o escravo, levando-o para aquilo que é, de fato, liberdade. Assim, aquele que é um dos “discípulos de fato(KJV) torna-se “livre de fato (KJV).
Nessas palavras de nosso Senhor, registradas nos versículos 32 e 36, podemos certamente ver o germe daquilo que é mais plenamente exposto nas epístolas. Romanos 6 revela a nossa morte com Cristo, levando-nos a ser “libertado do pecado” (KJV), que por sua vez leva à “novidade de vida”. Isso responde ao versículo 32 do nosso capítulo; enquanto o versículo 36 encontra sua contrapartida em Gálatas 4:1-7, conectada com 5:1. A redenção de debaixo da lei, operada pelo Filho, juntamente com o envio do Espírito do Filho em nosso coração, nos trouxe à liberdade na qual devemos permanecer firmes. O Filho nos libertou de fato.
Nos versículos 37-44, o Senhor muito solenemente expôs a falsidade da pretensão deles de ser filhos de Abraão. Haveria algum valor em sua reivindicação se eles tivessem se mostrado seus filhos em um sentido espiritual, mostrando sua fé e fazendo suas obras. Na verdade, eles foram marcados pelo ódio e pelo espírito homicida. Caim havia mostrado esse espírito, e ele era “do maligno e matou a seu irmão” (1 Jo 3:12); assim também eles faziam as ações de seu pai e, assim, manifestavam-se como sendo de seu pai, o diabo, que desde o princípio era homicida e não tinha nenhuma verdade nele. O ódio e a mentira são ambos gerados pelo diabo, e aqueles caracterizados por essas duas coisas, portanto, demonstram sua origem espiritual.
Jesus fala de Si mesmo, no versículo 40, como um “Homem que vos tem dito a verdade”. Outros falavam d’Ele como um homem, e não viam n’Ele mais do que isso; mas é impressionante que neste evangelho, que O apresenta como o Verbo feito carne, Ele fale de Si mesmo como Homem. Assim, a verdade é balanceada para nós, e tanto Sua Divindade essencial quanto Sua perfeita Humanidade tornaram-se abundantemente claras. Ele estabeleceu a verdade, e aqueles que tinham Deus como seu Pai amariam a verdade e O amariam. Seus oponentes tinham uma origem maligna e não podiam ouvir Sua palavra – a revelação que Ele trouxe. Consequentemente, eles eram totalmente incapazes de entender a Sua linguagem – as palavras com as quais Ele revestiu a revelação. Isto é o que o versículo 43 nos diz.
Note como as palavras do Senhor destroem totalmente a falsa ideia sustentada por muitos sobre a “paternidade universal de Deus”; mas esses religiosos judeus chegaram a ponto de reivindicar uma paternidade universal de Abraão e, portanto, de Deus, por sua nação. Jesus disse: “Se Deus fosse o vosso Pai .... Isso foi uma negação. O diabo era o pai deles. A paternidade de Deus é limitada àqueles que creem, como afirma Gálatas 3:26.
Diante destes judeus estava Um a Quem nem mesmo Seus mais amargos inimigos puderam convencer do pecado, e Ele lhes disse a verdade. Essa verdade honrou o Pai e libertou os homens da morte, mas eles recusaram a verdade, O desonraram, O chamaram de samaritano e disseram que Ele tinha um demônio. Eles se gloriaram em Abraão, embora admitissem que ele estava morto há muito tempo. O Senhor os encontrou como Alguém que sabia que Ele tinha vindo do Pai, que era honrado pelo Pai e que entraria em Seu próprio dia, para o qual Abraão havia esperado, e que pela fé ele o viu.
Os judeus, como sempre, se equivocaram completamente quanto às Suas palavras. Ele falou de Abraão vendo Seu dia, e eles pensaram que isso significava uma reivindicação de Sua parte de ter visto Abraão. O erro deles serviu para trazer à tona o grande e enfático pronunciamento: “Antes que Abraão existisse, EU SOU”. Em certo momento, Abraão “existiu”. O verbo usado aqui é o mesmo de João 1:14, onde lemos que o Verbo “Se fez” ou “Se tornou” (JND) carne. O verbo para “Sou” é aquele que significa a existência permanente, como usado em João 1:18; o Filho “está” no seio do Pai; e é usado no passado, como para o Verbo na eternidade passada, em João 1:1 e 2. Jesus, portanto, disse: Antes que Abraão viesse a existir, Eu eternamente Sou.
Esta tremenda reivindicação moveu os judeus a intentarem Sua morte por apedrejamento, e se a afirmação fosse falsa, eles teriam razão em fazê-lo. Certamente move nosso coração para adorá-Lo e para admirar a graça que O trouxe para a Humanidade e de forma tão humilde para a nossa salvação.

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