As intenções homicidas
dos judeus falharam não porque não tinham rigidez de propósito, mas porque Ele estava
além do alcance deles até que Sua hora chegasse. Escondendo-Se deles, Jesus deixou
o templo e, ao passar, encontrou um homem cego que devia prestar um
impressionante testemunho aos líderes de Israel e, em sua própria pessoa, tornou-se
outro “sinal” de que entre eles
estava verdadeiramente o Cristo, o Filho de Deus.
A pergunta que os discípulos
levantaram pode parecer curiosa para nós, mas expressou pensamentos que eram comuns
entre os judeus, encontrando sua base em Êxodo 20:5, que fala da iniquidade dos
pais sendo visitada sobre os filhos. A resposta do Senhor mostra que a aflição pode
vir sem que haja qualquer elemento de retribuição nela, mas simplesmente para que
a obra de Deus seja manifestada. Foi manifestada aqui ao produzir uma libertação
completa da aflição. Pode ser manifestamente demonstrada pela completa libertação
da depressão e do peso da aflição, enquanto a aflição em si mesma ainda persista;
e assim é vista frequentemente hoje em dia. Foi então o “dia”, marcado pela presença na Terra da “Luz do mundo”. Jesus sabia que a “noite” de Sua rejeição e morte estava se aproximando, mas até aquele
momento Ele estava aqui para fazer as obras do Pai, e esse cego era uma pessoa adequada
para a obra de Deus, embora não tivesse pedido por isso, até onde sabemos do
relato.
A ação tomada pelo Senhor
foi simbólica, como é mostrado pelo nome do tanque sendo interpretado para nós.
Jesus era o “Enviado”, que havia Se tornado
carne, e o lodo misturado com Sua saliva era o símbolo de Sua carne. Ora, os olhos
que vissem ficariam cegos se estivessem cheios de lodo, e os olhos cegos ficariam
duplamente cegos. Assim era para os espiritualmente cegos; a carne do Verbo era
uma pedra de tropeço e eles viram apenas o Filho do carpinteiro. Para nós que cremos
n’Ele como o Enviado, o contrário é verdadeiro. É pela Sua revelação em carne que
chegamos a conhecê-Lo, como 1 João 1:1-2 mostra. Sua carne é trevas para o mundo:
é luz para nós. Podemos adotar a
linguagem em um sentido espiritual e dizer que “lavamo-nos e voltamos vendo”. O
resto do capítulo mostra que o cego teve os olhos do coração abertos assim como
os olhos da cabeça.
Uma vez que seus olhos
espirituais foram abertos, sua medida de luz aumentou. A própria oposição que ele
encontrou serviu para produzir o aumento. O questionamento dos vizinhos surgiu da
curiosidade e não da oposição, e serviu para mostrar os fatos simples com os quais
ele começou. Ele sabia como seus olhos estavam abertos e que devia isso a um Homem
chamado Jesus, embora não soubesse nada a respeito d’Ele.
Seu caso era tão notável
que o levaram aos fariseus e, imediatamente, prevaleceu o espírito antagonista.
Não houve dificuldade em encontrar terreno para a oposição deles, pois o milagre
fora realizado no sábado. Mais uma vez, Jesus quebrou o sábado, e isso imediatamente
O condenou aos olhos deles. Fracassar nessa questão da observância cerimonial era
fatal: Ele não podia ser de Deus – uma conclusão bastante típica da mente farisaica.
Outros, no entanto, ficaram mais impressionados com o milagre, e assim uma divisão
foi novamente manifestada, o que os levou a perguntar ao homem o que ele tinha a
dizer sobre Ele. Sua resposta mostrou que o Homem chamado Jesus era, pelo menos
para ele, um profeta. Isso era mais do que eles admitiam, então questionaram a verdade
de sua cura milagrosa.
Os pais agora foram convocados
para a discussão, apenas para testemunhar que ele nasceu cego de fato, de modo que
sua cura estava fora de questão, embora o medo os levasse a encaminhar todas as
perguntas para o próprio homem; e o fato é que o veredicto dos fariseus sobre o
caso era uma coisa já decidida. Qualquer um que confessasse que Jesus era o Cristo
deveria ser excluído de todos os privilégios religiosos do judaísmo. Assim, seus
motivos básicos foram revelados, e eles continuaram a examinar o homem não para
obter a verdade, mas para descobrir algum motivo possível para condenar Jesus ou
o homem, ou ambos.
Atribuiria o cego o louvor
a Deus, enquanto concordasse que o homem por Quem o poder de Deus era exercido era
um pecador? Ele evitou essa armadilha sutil simplesmente afirmando novamente o único
ponto para o qual ele estava inabalavelmente certo. Como um general habilidoso que
declina a batalha no terreno escolhido pelo inimigo e só enfrentará o inimigo em
sua própria posição inconquistável, assim ele recusou a mera discussão teológica,
na qual não era páreo para eles, e tomou sua posição naquilo que sabia ter sido
produzido em si mesmo. As palavras do homem no versículo 25 estão cheias de instruções
para nós. Um iletrado menino lavrador de hoje pode, humildemente, mas ousadamente
enfrentar numerosos adversários tanto dos fariseus quanto dos saduceus, se contente
em apenas testificar daquilo que a graça de Deus fez por ele e nele.
Em seguida, tentaram extrair
do homem detalhes mais exatos do método que Jesus utilizou, se por acaso pudessem
encontrar um ponto de ataque. Entretanto, ele havia percebido a hostilidade deles
e a pergunta “Quereis vós porventura
fazer-vos também Seus discípulos?” tinha um toque de sarcasmo. Isso os feriu
a ponto de perder o equilíbrio tanto que, embora declarando sua adesão a Moisés,
eles se comprometeram com uma declaração de ignorância quanto à origem e credenciais
de Jesus. Eles adotaram a atitude “agnóstica”, assim como muitos fazem hoje. Isso,
no entanto, foi uma admissão fatal. A perda do seu temperamento foi seguida pela perda do seu
caso de um ponto de vista argumentativo. Se o crente simples se apegar aos fatos
fundamentais sobre os quais pode dar testemunho, não sofrerá nenhuma derrota quando
encontrar o agnóstico.
Esses fariseus, que se
apresentavam como as supremas autoridades religiosas da época, não apenas professavam
ignorância quanto a essa tão vital questão, mas também exigiam um veredicto sobre
a questão totalmente contrária à evidência. O poder benéfico operara inegavelmente,
produzindo a libertação do mal: eles professavam a ignorância de sua fonte, mas
exigiam que aqu’Ele que empunhava esse poder fosse denunciado como pecador. O homem,
no entanto, sentiu a ação do poder; ele sabia que era de Deus, e a oposição perversa
que ele encontrou só o ajudou a chegar à conclusão de que o próprio Jesus era
verdadeiramente “de Deus”.
Tendo perdido o caso e
tendo falhado em corromper os pensamentos do homem, eles recorreram à violência
e expulsaram-no. No que diz respeito ao judaísmo, ele foi excomungado: haveria alguma
coisa para o pobre homem, exceto o paganismo, com suas trevas vazias? Sim, havia.
O próprio Jesus já estava moralmente fora do judaísmo; desde o início deste
evangelho Ele tem sido visto assim, como já dissemos antes, apesar de não estar
fora dele no sentido mais amplo até ser levado para fora do portão de Jerusalém
para morrer a morte do malfeitor. No versículo 35 vemos o Salvador rejeitado encontrando
o homem rejeitado e propondo-lhe a maior das questões – “Crês tu no Filho de Deus?” A questão chegou a ele de uma forma abstrata.
O homem hesitou, pois desejou que o Filho de Deus estivesse diante dele em forma
concreta. Onde ele deveria encontrá-Lo para que pudesse crer? Assim desafiado, Jesus
Se apresentou claramente como o Filho de Deus. O homem imediatamente, e tão
claramente, O aceitou como tal em fé e O adorou.
Então, mais uma vez, somos
conduzidos ao ponto principal deste evangelho como expressado no versículo 31 do
capítulo 20. O homem foi levado passo a passo à fé do Filho de Deus e à vida em
Seu nome, e à abertura de seus olhos físicos tinham sido um sinal da obra maior
de abrir os olhos de sua mente e coração. No versículo 39, temos o comentário do
Senhor em toda a cena. Ele tinha vindo ao mundo para julgamento – não no sentido
de condenar os homens, mas como produzindo uma discriminação que cortava as aparências
superficiais e alcançava os homens como eles realmente eram. Alguns, como este homem,
tiveram os olhos abertos para ver a verdade. Outros que professavam ser os que enxergavam,
como os fariseus, podiam ser cegados e manifestados como cegos. Alguns fariseus
que estavam presentes suspeitaram que Ele Se referiu a eles, e a pergunta deles
deu uma oportunidade para que a perigosa posição deles fosse mostrada. O pecado
deles estava na hipocrisia. Eles tinham visão intelectual, mas eram espiritualmente
cegos e seu pecado permanecia; Por outro lado, aqueles que são realmente cegos
e, confessam ser assim, são objetos de compaixão.